Lição 002... A fé que foi entregue aos Salvos

Pela Fé Que Foi Entregue aos Santos

Gilson Carlos de S. Santos

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“...senti a necessidade de vos escrever, exortando-vos a pelejar

pela fé que de uma vez para sempre foi entregue aos santos” (Jd 3)..

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Uma das palavras mais freqüentes na Bíblia é “fé”. Conceito chave,

esta palavra descreve um ato que passa pela inteligência e pela vontade.

Na Bíblia, fé significa confiança absoluta em tudo que Deus tem revelado;

a confiança que possuímos no testemunho que Deus manifesta acerca

de Si mesmo. Às vezes, esta palavra aparece para descrever o exercício

da fé por parte do homem espiritual, a crença ativa, a dependência de

Deus. Outras vezes, para descrever o objeto da fé, aquilo em que alguém

crê, o sistema de princípios religiosos (como é o caso do cristianismo),

o anúncio doutrinário na forma de um credo.

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“Vigiai, estai firmes na fé, portai-vos varonilmente

e fortalecei-vos...” (1 Co 16.13 - ARC).

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“Se, na verdade, permanecerdes fundados e firmes na fé

e não vos moverdes da esperança do evangelho que tendes ouvido,

o qual foi pregado a toda criatura que há debaixo do céu,

e do qual eu, Paulo, estou feito ministro” (Cl 1.23 - ARC).

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“Amados, procurando eu escrever-vos com toda a diligência

acerca da salvação comum, tive por necessidade escrever-vos

e exortar-vos a batalhar pela fé que uma vez foi dada

aos santos” (Jd 3 - ARC).

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“E crescia a palavra de Deus, e em Jerusalém se multiplicava

muito o número dos discípulos, e grande parte dos sacerdotes

obedecia à fé” (At 6.7).

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Há algumas perguntas que nos ajudam a avaliar nossa fé. Neste

editorial propomos três perguntas através das quais podemos fazer uma

radiografia dela. São perguntas importantes e reveladoras.

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1. Em Que Você Crê?

O conteúdo da nossa fé é fundamental. Aquilo em que você crê

constitui aquilo que você é. E só a verdade é digna de ser crida. Alguém

já disse que “a piedade é filha da verdade, e precisa ser alimentada... não

com outro leite que não seja o de sua mãe”. John Owen afirmou que

“somente a verdade capacita a alma a dar glória a Deus”. Hoje em dia

ouvimos expressões tais como: “Não importa o que você crê, conquanto

seja sincero”; “Todos os caminhos levam a Deus”, etc. Ao que nos

parece, esta será a religião do século 21. Isto, contudo, é uma grande

falácia. Aquilo que você crê constitui o alicerce da sua vida. Aquele que

crê mal não pode viver bem, pois não tem alicerces.

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Nossa fé requer um conteúdo. Fé sem conteúdo não é a fé bíblica:

é misticismo ou superstição. E o conteúdo sólido para alicerçarmos nossa

vida tem de ser a verdade. Permaneça fiel às suas convicções, mas

assegure-se de que elas são verdadeiras. Jesus disse: “Conhecereis a

verdade, e a verdade vos libertará” (Jo 8.32). Somente a verdade liberta

e consola. Nossa liberdade consiste em sermos cativos da verdade. Um

filósofo dinamarquês disse que, “para ser forte, preciso descobrir a

verdade, pela qual eu possa viver e morrer”.

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Aquilo que você crê

constitui aquilo que você é.

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Vivemos tempos em que as pessoas estão à procura de mestres que

lhes agradem. Líderes e movimentos religiosos, inclusive no meio

evangélico, têm, como premissa essencial de sua prática e base de sua

agenda, o pensamento corrente, os conhecimentos da psicologia e as

tendências culturais. Surgem doutrinas que agradam multidões e

pregoeiros que mais se parecem com aqueles animadores de programas

de auditório. Entretanto, a questão não é se uma doutrina é bela, atraente,

impressionante ou popular, mas se é verdadeira. O bispo de Hipona

escreveu: “Se você crê somente no que gosta do evangelho e rejeita o

que não gosta, não é no evangelho que você crê, mas em si mesmo”. E

o reformador Lutero adverte-nos: “qualquer ensinamento que não se

enquadre nas Escrituras deve ser rejeitado, mesmo que faça chover

milagres todos os dias”. No fim, a verdade triunfará. A verdade é sempre

forte, não importa quão fraca pareça; e a falsidade é sempre fraca, não

importa quão forte pareça.

Por nós Jesus orou. Ele pediu ao Pai: “Santifica-os na verdade; a

tua palavra é a verdade” (Jo 17.17).

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2. Como Você Crê?

A forma e a intensidade da fé têm grande importância. A fé é algo

que se desenvolve mediante o uso. Ela precisa ser desenvolvida. Assim,

a fé pode aumentar e ser fortalecida. Há níveis variados de fé, pois há

níveis variados de desenvolvimento da alma. Por isso, fazem sentido

expressões bíblicas tais como: “Homens de pouca fé”; “Geração

incrédula”; “Fé do tamanho de um grão de mostarda”; “Mulher, grande

é a tua fé”; “Nem mesmo em Israel encontrei tamanha fé”. Dos pedidos

que os discípulos fizeram ao Mestre Jesus Cristo, dois se destacam. O

primeiro é “ensina-nos a orar”; e o segundo, “aumenta-nos a fé”.

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Esta questão da forma e da intensidade da fé pode ser percebida de

maneira bem nítida nas palavras de Jesus dirigidas a Tomé, no segundo

domingo após a ressurreição. Como sabemos, Tomé esteve ausente na

reunião do primeiro domingo (o que já constitui um ponto negativo) e

não creu na notícia de que Jesus havia ressuscitado dentre os mortos.

Após haver contemplado o Senhor, colocado o dedo nas feridas dos

cravos em suas mãos e apalpado as chagas do seu lado, Tomé creu. E

disse-lhe Jesus: “Porque me viste, creste? Bem-aventurados os que não

viram e creram” (Jo 20.29).

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De fato, a fé bíblica é a confiança que temos no testemunho que

Deus manifesta acerca de Si mesmo. Ao crente basta a Palavra de Deus.

Deus falou a Abraão, e este creu. Lamentavelmente, vivemos um tempo

em que a geração incrédula e adúltera pede e busca sinais a fim de crer.

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Escrevendo sobre questões relacionadas à esfera da liberdade cristã,

o apóstolo Paulo disse aos romanos: “Mas aquele que tem dúvidas, se

come está condenado, porque não come por fé; e tudo o que não é de fé

é pecado” (Rm 14.23 - ARC). A nossa fraqueza nasce de nossa falta de

convicções arraigadas. Precisamos de homens com fé inabalável na

Palavra do Senhor, com coragem para tomar posição em sua proclamação

e defesa e com disposição e tenacidade para assumir os custos de tal

decisão. Afinal, uma bigorna não tem medo dos martelos, e, como alguém

já disse, “razões fortes levam a decisões enérgicas”.

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Walt Disney criou um personagem que ele entendeu representar

bem o Brasil. Foi o Zé Carioca. Um papagaio que caracteriza o carioca

típico dos morros da cidade do Rio. De fato, o papagaio é uma ave bem

brasileira. A singularidade dessa ave é que, por via de regra, imita bem a

voz humana. Todavia, é um mero repetidor do que ouve constantemente.

Também, em religião, os “papagaios” proliferam em nosso país. Estes

repetem idéias que têm ouvido desde o berço ou práticas e doutrinas da

moda, sem jamais terem chegado a uma experiência pessoal com Deus.

Quando Pilatos interpelou Jesus, com as palavras “És tu o rei dos judeus?”,

Jesus respondeu ao governador, fazendo outra pergunta: “Dizes isso de

ti mesmo, ou disseram-to outros de mim?” Ecoar o que se ouve, sem

uma fixação pessoal, é tornar-se um papagaio.

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Este é um sintoma alarmante de nossa época: muita gente “ecoando”

um cristianismo que não passou da gravação, na memória, de algumas

respostas do catecismo e alguns textos ou referências da Bíblia. Fé viva

na Palavra e vivência com Deus nunca foram experimentadas por tais

pessoas. E, quando chegam as horas difíceis, em que a vida espiritual

tem de passar por uma prova de fogo, a “religião de segunda mão” não

oferece o apoio de que precisa o “religioso”, que entra em pane e atola.

Necessitamos de uma geração de homens “religiosos de primeira mão”,

que falem ou cantem o que afirma o Salmo 23: “O Senhor é o meu

pastor...” Como você crê? Como andam as suas convicções?

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O conhecimento da verdade deve nos levar à convicção da verdade.

Jesus lançou a seguinte pergunta ao povo, acerca de João Batista: “Que

fostes ver no deserto? Uma cana agitado pelo vento? ... Mas, então que

fostes ver? Um profeta? Sim, vos digo eu, e muito mais do que profeta

(Mt 11.7-9 - ARC). É terrível quando ouvimos a respeito de alguém: “Ele

nunca tem opinião própria; costuma adotar a que estiver em voga”. Eis

aí um caniço agitado pelo vento. O profeta do Senhor não é aquele que

se orienta pelo catavento da opinião pública, mas pela bússola da convicção

bíblica. O nosso mundo é rico em ilusões, e, por vezes, nos deixamos

iludir por ele. Somos tentados a preferir o caminho fácil e seguir o curso

da multidão. Porém, aqueles que têm por filosofia de vida acompanhar

as multidões freqüentemente se perdem no meio delas. Spurgeon um dia

concluiu sobre a insanidade de alguém se guiar pela popularidade e disse:

“Já faz muito tempo que parei de contar cabeças. Geralmente a verdade

está com a minoria neste mundo mau”.

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O mundo carece de homens que crêem naquilo que pregam. Nos

tempos da bastilha francesa, Mirabeu falou de Robespiere, quando este

fazia um discurso: “Este homem vai longe; ele acredita naquilo que diz!”

É lamentável dizer, mas há muitos de nossos pregadores e teólogos que

simplesmente não crêem naquilo que pregam. Se crêem, a forma como

pregam parece negar-lhes a eficácia de sua fé.

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3. O Que Você Faz Com O Que Você Crê?

O que fazemos com a fé é muito importante. Se algo é digno de ser

crido, é digno de ser vivido. De fato, a fé bíblica implica em obediência.

A fé bíblica traduz-se em discipulado. Não crê aquele que não vive

consoante à sua crença. “Assim, também a fé, se não tiver obras, por si

só está morta” (Tg 2.17). Um pressuposto da pregação da Palavra de

Deus é que o propósito subjacente a toda doutrina é garantir a ação

moral. Aprendemos por simples verificação semântica que teologia é

conhecimento de Deus. Sua teologia consiste naquilo que você é quando

pára de falar e começa a agir. Deus quando nos instrui a mente, Ele o faz

para transformar a vida. Aliás, este é o alvo do ensino, e a lei do processo

de aprendizagem estabelece que o aluno deve reproduzir, em si próprio,

a verdade aprendida. E vivendo a verdade, nossas próprias vidas se tornam

verdadeiras. Nós nos tornamos o que devemos ser.

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Precisamos de homens com fé inabalável

na Palavra do Senhor, com coragem para

tomar posição em sua proclamação e

defesa, com disposição e tenacidade

para assumir os custos de tal decisão.

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Uma fé digna de ser crida é digna de ser proclamada. Novamente

recorro a Spurgeon, que disse: “Os homens, para serem verdadeiramente

ganhos, precisam ser ganhos pela verdade”. Hoje a teologia é vista como

reflexões dos ambientes eruditos, aprisionada nos recintos acadêmicos

dos seminários. Faz-se uma grande dissociação entre o conteúdo dos

compêndios empoeirados das bibliotecas dos teólogos e a ação pastoral

na igreja e a vivência comum do crente com Deus. Não tenhamos o

mínimo interesse numa teologia que não promova o ardor por Deus; não

tenhamos qualquer interesse por uma teologia que não evangelize e uma

fé que não seja missionária.

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A verdade precisa ser proclamada, não importa como seja recebida.

E deve ser proclamada, antes de tudo, porque é a Verdade de Deus.

Proclamar a Palavra glorifica o seu santo Nome. A pregação é sem dúvida

um bem eterno. Essa foi a conclusão dos apóstolos quando elegeram

“os sete”. O bem que se faz aos homens é passageiro; as verdades que

lhes deixamos são eternas.

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Uma fé digna de ser crida é também digna de que batalhemos por

ela. O melhor método para a erradicação do erro ainda é publicar e praticar

a verdade. Precisamos tornar clara nossa posição, com palavras e obras,

em favor da verdade e contra as falsas doutrinas. Quase sempre, é no

vácuo deixado pela negligência e descaso em proclamarmos “todo o

conselho de Deus” que proliferam as seitas e heresias. Quando a verdade

silencia, as opiniões falsas parecem plausíveis. A verdade amordaçada é

uma contradição e impropriedade, pois a verdade é sempre o argumento

mais forte.

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Sê fiel até à morte.” Não foi este o lema dos mártires desde Estêvão?

Senti a necessidade de vos escrever, exortando-vos a pelejar pela fé que

de uma vez para sempre foi entregue aos santos” (Jd 3). No eminente e

constante desafio de estar comprometida com a fé que foi entregue aos

santos, esta revista se apresenta ao leitor. Fazemo-lo com humildade,

reverência e tremor. Mas fazemo-lo varonilmente.

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Neste primeiro número trazemos o artigo O Perfeito Equilíbrio da

Verdade de Deus, onde Geoffrey Thomas, integrante da equipe editorial

do The Banner of Truth Journal e pastor batista no País de Gales, procura

estabelecer um equilíbrio entre algumas verdades que, aparentemente,

encontram-se em conflito umas com as outras. Em determinados

momentos da história da Igreja, os verdadeiros servos do Senhor tenderam

a enfatizar certas doutrinas em detrimento de outras. A geração seguinte

reagiu contra essa ênfase da geração precedente, e assim aconteceu o

fenômeno que alguns historiadores denominam de “movimento pendular”.

O autor é feliz na sua exposição, ao propor um equilíbrio em

alguns dos pontos fundamentais da fé e prática cristãs.

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O Supremo Dever do Pastor é um artigo do Dr. Thomas K. Ascol,

pastor batista em Cape Coral, Flórida, e editor do The Founders Journal.

Qual o supremo dever do pastor? Salientando os diversos aspectos que

envolvem o ministério pastoral nos tempos atuais, o autor encontra, no

emaranhado de responsabilidades que ao pastor se atribui, o dever de

pregar a Palavra de Deus. Seu artigo é muito oportuno, mormente nesses

tempos em que vozes e movimentos questionam acerca da relevância da

pregação bíblica, nos dias atuais.

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A. W. Tozer, pastor de uma igreja da Aliança Cristã e Missionária até

seu falecimento na década de 1960, é conhecido como “um profeta da

nossa geração”. Seu artigo, Precisamos Novamente de Homens de Deus, é

uma convocação a agradar a Deus e ignorar a multidão, numa geração

pragmática e materialista. A voz de Deus é a voz de Deus. A voz do povo

é a voz do povo. Quão desesperadamente precisamos hoje dessa mensagem.

Deus está procurando homens que tenham a coragem de tomar posição e

assumir o preço dela, no meio desta geração. Na decadente era pré-diluviana,

Ele encontrou Noé. O mundo está necessitando novamente de homens

como Noé - “pregoeiro da justiça” - a quem o Senhor disse: “Tenho visto

que és justo diante de mim nesta geração” (Gn 7.1).

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Em Quanto ao Vir a Cristo, Ernest Reisinger, veterano pastor batista

na Flórida e editor assistente do The Founders Journal, analisa os

fundamentos histórico-teológicos de uma das práticas mais comuns à

chamada “pregação evangelística” contemporânea: o sistema de apelo.

O autor, numa análise acurada, apresenta os perigos e equívocos em

torno desta prática (inaugurada por Charles Finney), entre os quais, a

freqüente associação e/ou permuta que se faz entre a regeneração operada

pelo Espírito Santo e um ato físico exterior. É um artigo que se enseja

bastante oportuno. O que temos nesta edição, contudo, é apenas a primeira

parte. Aguarde a conclusão no próximo número.

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Em Sansão e a Sedução da Cultura, Roger Ellsworth nos adverte

quanto ao perigo de nos tornarmos enamorados e, deste modo, divididos

pela cultura. Ele o faz de maneira bastante ilustrativa, recordando-nos a

história de Sansão e seu encanto por Dalila. Ellsworth conclui seu artigo,

alertando sobre o dever de permanecermos fiéis e não nos deixarmos

seduzir pela cultura que, por Deus, fomos chamados a influenciar.

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Dois pequenos artigos complementam o conteúdo deste número.

Pequenos, mas nem por isso de menor importância. Outro Evangelho é

um artigo que se revela bastante atual. Foi extraído dos escritos de A.W.

Pink, teólogo reformado falecido em 1952. Trata desse “evangelho” atual

cuja maior aspiração é paz, unidade e irmandade. A mensagem desse

evangelho objetiva tornar o mundo tão confortável e um habitat tão

harmonioso, que a ausência de Cristo não será percebida, e a necessidade

de Deus não existirá. As Implicacões do Livre-arbítrio, citado de C. H.

Spurgeon, faz breve análise do conceito humanista do livre-arbítrio em

contradição com a doutrina bíblica da livre agência do homem. O que

pensamos sobre livre-arbítrio? Como isto se relaciona com a vontade

soberana e a graça eficaz de Deus? Não estaremos colocando o homem

onde Deus deve estar?

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Uma de nossas expectativas é que essas leituras estimulem o leitor a

batalhar pela fé que de uma vez para sempre foi entregue aos santos.

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