Diz-se do larápio bem vestido. Diferente do ladrão pé de chinelo, quase sempre maltrapilho. Difere um do outro na prática do delito. O pé de chinelo usa a violência para colimar o seu objetivo. O de casaca age sub-repticiamente, sem agredir a vítima. Sem que esta perceba sua ação. Furta o objeto sem que a vítima tome conhecimento do delito praticado. Ambos são ladrões. Ambos geram prejuízos e traumatizam suas vítimas. Todos já fomos vítimas de um ou de outro ou dos dois. Qual o Pastor que já não teve um livro de estimação de sua biblioteca, levado por um visitante ilustre?
Durante o Congresso da ABM, em Buenos Aires, uma ovelha minha foi vítima do ladrão de casaca. Num restaurante, onde todos os clientes estavam bem vestidos, ternos, gravatas e alguns com casacos especiais, sentamos à mesa e, como o serviço era self-service, a ovelha, crédula, que todas aquelas pessoas bem vestidas, eram gente de bem, pendurou a bolsa na cadeira com documentos e dinheiro e foi servir-se. Ao voltar, descobriu que os dois ilustres cavalheiros não estavam mais ao lado e a bolsa também não. Foram dois dias de angústias na embaixada brasileira, a tentar documentos para retornar ao Brasil. Passagem, cartões de créditos, tudo tinha sido surrupiado pelos distintos larápios.
Para denunciar que havia sido roubada, as autoridades argentinas exigiam da vítima testemunhas oculares. Alguém que tivesse presenciado o delito. Fosse ladrão pé de chinelo seria mais fácil. Ladrão de casaca estava protegido pela lei. Não havia como denunciá-lo. Você não pode acusar aleatoriamente. Não há denuncia anônima.
Você deixa o carro estacionado enquanto vai ao médico. Ao retornar, quarenta minutos após, encontra o local vazio. Ou então se depara com a ausência do som no carro. Uma chave mixa possibilitou o “serviço” do meliante. Ele pode até estar por perto e às vezes está. Conta-lhe uma história de um assalto no dia anterior em que houve tiros e alguém foi parar no hospital. Ao ouvir a história você até agradece de não ter estado no local na hora do crime. Poderia levar um tiro. Ainda bem que o ladrão que lhe furtou não o agrediu. Afinal, carro compra-se outro ou então o seguro repõe. Mas não deixa de ser roubo e gerar prejuízos e traumas.
Satanás, como ladrão, trabalha nas duas esferas. Em alguns casos ele age como pé de chinelo. Mata para roubar. Faz barulho, chama a atenção ao eliminar suas vítimas. Jesus diz que ele mata, rouba e destrói a sua presa. Derrama sangue, mas não deixa de ser ladrão. No seu agir o ladrão de casaca, bem vestido, moderno, bem apresentável, sorrateiro, teologicamente correto, sútil, às vezes como anjo de luz, 2ª Coríntios 11:14, não permite que suas vítimas atentem para o engodo, a que são submetidas.
Ele introduz, com o consentimento de suas vítimas, em cada cômodo da casa um televisor e um computador. Cada filho tem o seu para usá-lo até altas horas, sem atentar para a necessidade dos estudos ou descanso. No quarto do casal ele coloca um de tela maior. A intimidade desaparece. A TV passa a ser a amante dos dois. Após algum tempo, não muito longo, a família está desestruturada. Caso integrem uma Igreja que ainda insiste em manter a EBD, esta está descartada por todos os membros da família, como obsoleta. Sem que os pais percebam aparecem as drogas e a gravidez da adolescente. As brigas se sucedem. O mutismo, qual câncer silencioso, corrói o que sobrou de uma família até então feliz. Nenhuma porta foi arrombada. Ninguém foi agredido fisicamente. O ladrão de casaca, sem fazer barulho, destruiu a comunhão com Deus. A indiferença passa a ser a religião da família. Todos passam a ser membros da Igreja em casa, mas sem Igreja. Todas as mazelas do mal se alojam no lar. Dos cabeludos, tatuados, drogados, adolescentes revoltados, aos abortos consentidos para preservar a “dignidade” da família, tudo é valido. Outras desgraças passam a compor o cenário da família, antes tão fiel às lides do Senhor. Satanás não fez barulho. Não precisava. Ladrão de casaca age em surdina.
É o salvo consagrado e dedicado ao serviço do Senhor. Ocupado abandona a leitura diária da Bíblia. Faz uma oração relâmpago enquanto tira o carro da garagem. Deixa de comparecer aos cultos para administrar a construção da casa nova. Não “tem” mais tempo para oferecer a Deus. Está sempre ocupado. Endividado a correr atrás de mil atividades para sobreviver. Chega o dia em que o culto com os outros irmãos não lhe faz bem. Aliás, a seus olhos de lince, transplantados por Satanás, passa a ver todos os defeitos dos demais salvos. Todos são desonestos. Incrédulos, pecadores imperdoáveis, hipócritas, não dignos do rebanho do Senhor. Por isso ele prefere sair borboleteando à procura da Igreja perfeita. Não consegue encontrá-la. Pois não há Igreja perfeita para Satanás. Todas têm defeitos e, muitos. Satanás é perito em ver cisco nos olhos dos outros. Sua lupa não deixa escapar nem um grãozinho de areia. Razão simples, Jesus não edificou a Igreja para abrigar a Satanás, mas sim pecadores carentes da Graça de Cristo.
É triste, mas o ladrão de casaca entra nas Igrejas. Às vezes consegue se imiscuir no rol de membros. Ocupa cargos. Dá palpites na administração. Critica as mensagens dos pregadores. Detesta as vestes das irmãs. É moralista. Faz tudo para afastar o pecador de um verdadeiro encontro com Jesus. Seu objetivo é desviar os salvos da verdadeira alegria da salvação. Ladrão sempre é ladrão e deve ser tratado como surripiador. O pé de chinelo promove barulho e agride. O de casaca age sem ser percebido. Ao final o resultado é o mesmo. Vidas feridas. Prejuízos, destruição e morte. Estar atento aos ladrões que tentam roubar a alegria da verdadeira comunhão com Deus há que ser o desafio diário de cada salvo, que deseja proceder como servo fiel. Cuidado com os ladrões que rondam sua vida.