lição 5 - INVISÍVEL, MAS PERCEPTÍVEL.

STRESSBUSTERS As sete principais causas do stress. As sete afirmações do stressado. As sete respostas do Salmo 23 Causa # 5 do Stress: Vales da sombra da morte

INVISÍVEL, MAS PERCEPTÍVEL.

As sombras da morte são a quinta grande causa do stress. O estressado vive dizendo: “Eu não consigo ver nada“. O Salmo 23 nos ensina a dizer: “Tu estás comigo“.

Em Israel, havia um “vale da sombra e da morte”. Até hoje, na velha estrada que leva de Jerusalém a Jericó, há um grande precipício que conduz a um abismo profundo onde o sol não chega. Aquela estrada rota antiga e necessária, era caminho de muitos pastores com seus rebanhos, e muito provavelmente naquele despenhadeiro muitas ovelhas se perderam. Esse vale, muito provavelmente ocupou o pensamento de Davi, quando ele afirmou: “Ainda que eu passasse naquele abismo profundo, e atravessasse aquele vale de escuridão e de sombra da morte, eu não temeria mal algum, porque Tu estás comigo”.

Mas o que esta figura do vale poderia significar para nós? Temos dois caminhos de interpretação. O primeiro é dar asas à imaginação, optando pela interpretação alegórica, dando nomes aos “vales de sombra da morte” que atravessamos na vida. Coisas como desemprego, enfermidades, divórcio, e outros mais. Esse não me parece ser o caminho mais razoável.

Fiz a segunda opção. Tentei definir “vale da sombra da morte” à luz do que o próprio texto diz. Antes, porém, considero necessárias cinco observações feitas por Rick Warren a respeito dos “vales da sombra da morte”. A primeira delas diz que vales são inevitáveis. É impossível viver sem se ver na escuridão e num vale sombrio em algum momento da vida. Alguns vales duram muitos anos, outros semanas, outros, frações de segundo, ou mesmo apenas uma noite, mas é impossível que um ser vivo, passando neste mundo caído, não se defronte em algum momento com o vale de escuridão. Jesus disse que no mundo nós teríamos aflições. Ele não disse que seria possível, mas Ele afirmou categoricamente que as teríamos.

A segunda afirmação de Rick Warren é que vales são imprevisíveis. Eles não estão no nosso planejamento. Não podemos antecipá-los. O vale pode chegar para você hoje à noite, pode chegar para você dentro de poucos minutos, inclusive. Quando você apertar o botão da sua secretária eletrônica pela próxima vez, o recado poderá não ser bom. O vale chega sem avisar, como disse Jeremias, o profeta, “ele chega de súbito”. Não estou rogando praga, e não adianta bater três vezes na madeira. Lembre-se que vales são inevitáveis.

Em terceiro lugar, vales são imparciais. Vales são lugares pelos quais todos nós passamos: brancos e negros, pobres e ricos, velhos e crianças, brasileiros e japoneses, e assim por diante.Por esta razão, quando você passar pelo vale, não precisa se culpar, achando que é um ser humano pior do que os outros que não estão atravessando o vale, ou duvidar do amor de Deus por você, como se amasse você menos do que aos outros que não estão atravessando o vale. Vales são imparciais, como diz a palavra de Deus, “o sol vem sobre justos e injustos”, mas também a noite escura vem sobre todos.

Rick Warren diz também que vales são temporários. Eles não duram para sempre. Alguém disse que “não há bem que sempre dure, e não há mal que nunca acabe”. Os vales têm um período de duração definido, mesmo porque a vida não é um vale. Nós passamos pelo vale, mas a vida não é uma vale. E a razão pela qual o vale é tão identificado é que ele é exceção à vida.

Quando começamos a tratar a vida como um vale, deixamos com que todo o nosso corpo seja tenebroso. Talvez seja isso o que Jesus tenha dito no Sermão do Monte, dizendo que os nossos olhos precisam ser iluminados, para que possamos enxergar o mundo como de fato o mundo é, e a vida como de fato a vida é. Porque se enxergarmos apenas as dimensões escuras e sombrias, a vida se torna insuportável e nós desfalecemos.

Finalmente, vales são cheios de propósitos, ou, como prefiro, vales são cheios de possibilidades. Alguém disse que a diferença entre o pessimista e o otimista é que “o pessimista, em cada oportunidade, vê um problema, e o otimista, em cada problema, vê uma oportunidade”. Esta deve ser a postura do cristão: ver, em cada vale, um sem-número de possibilidades e oportunidades na presença de Deus. Como diz o ditado, “por trás de um monte de dificuldades existe um mundo de oportunidades, ou uma úlcera: depende da maneira como olhamos para o monte de dificuldades”.

Algo muito interessante na Bíblia é que, especialmente nas epístolas paulinas, somente a tribulação produz alguma coisa em nós. E isto já vem desde o sábio do Eclesiastes, que diz que é melhor estar na casa onde há luto do que na casa onde há festa (Eclesiastes 7.2,3).

Os dias de festa, de bonança, maré mansa, alegria, prosperidade automática, são períodos absolutamente perigosos, porque trazem uma falsa sensação de segurança e nos faz achar que jamais seremos abalados (Salmo 30.6). Nessas horas, nos descuidamos e abaixamos a guarda. Ficamos vulneráveis demais. Quase chegamos a acreditar em Papai Noel e num mundo cor de rosa. Que perigo!

Nossa tendência, nos tempos de estabilidade é nos tornarmos displicentes para as coisas essenciais. Por isso é que a Palavra de Deus vem dizer que somos purificados no fogo, aperfeiçoados no meio da tormenta, tocados por Deus exatamente nos vale da sombra da morte. Mesmo porque no vale, estamos muito mais sensíveis a Ele.

Portanto, como podemos caracterizar o vale? Creio que podemos desenhar os “vales da sombra da morte” com sete afirmações deduzidas do próprio Salmo 23.


O QUE É O VALE DA SOMBRA DA MORTE? VALE DA SOMBRA DA MORTE É UMA CIRCUNSTÂNCIA QUE INDICA A PROXIMIDADE DO FIM.

Você está no vale da sombra da morte quando você percebe que a morte ainda não chegou, mas a sombra da morte já cobriu você. Você não chegou ao fim, mas o fim já está chegando perto de você.

Algumas pessoas tentam tratar a morte com certa poesia e beleza. Mas a morte na Bíblia nunca foi tratada com poesia e beleza. A morte na Bíblia nunca foi tratada como uma coisa boa. Essa idéia de que cristãos podemos encarar a morte com alegria e tranqüilidade não vem da Bíblia. A morte é sempre uma violência, a morte é sempre uma afronta ao projeto original de Deus.

Deus não nos criou para morrer. Não fosse o pecado, não haveria a morte, porque “a morte é o salário do pecado” (Romanos 6.23). Inclusive, traduzimos muito mal o Salmo que diz que “preciosa é à vista do Senhor a morte dos seus santos” (116.15), como se a Bíblia estivesse a dizer que Deus se agrada quando um dos seus santos morre. Na verdade, a palavra “preciosa” indica que a vida de um dos santos de Deus tem grande valor, grande custo, grande preço, e que a morte de um deles, portanto, custa muito caro para Deus. Ninguém foi criado para passar pela traumática experiência da morte, porque a morte determina o fim de um ciclo, a morte determina o fim das possibilidades, a morte, ainda que nos remeta ao mundo das plenas possibilidades, é uma violência, pois Deus nos criou nesse mundo aqui.

Pôr isso à morte é uma violência ao projeto original de Deus. A morte interrompe algo que não era para ser interrompido. Nesse sentido, o Salmo 23 vem dizendo que há momentos em que nós estamos percebendo que alguma coisa muito boa será estancada, que algum processo cheio de possibilidades, de prazeres receberá o ponto final. O vale da sombra da morte indica que nossas esperanças estão chegando ao fim. Nossas expectativas de perpetuar algo desejável estão cada vez mais fracas, e nossas possibilidades diminuindo rapidamente.

O vale da sombra da morte indica a proximidade do fim, quando já tentamos tudo e acreditamos que o próximo passo, a próxima notícia, vai ser um ponto final trágico. Esse é o vale da sombra da morte. Quando você está aos pés de Jesus, dizendo: “Vá até a minha casa, a minha filha está doente, vá até lá, imponha as mãos sobre ela para que ela viva”. Mas, alguém vem nos seus ouvidos e diz baixinho: “A sua filha já morreu, não incomode mais o Mestre” (Marcos 5.23,35). Isso é vale de sombra da morte.

Enquanto Jairo está sacudindo Jesus e dizendo: “Pelo amor de Deus, eu ainda tenho esperanças, pelo amor de Deus, vá até a minha casa, faça alguma coisa, eu ainda não me entreguei”, ele está no vale. Mas chega um momento em que você se entrega, como que desistindo, e diz: “Eu já fiz tudo o que podia... acho que daqui pra frente é só esperar o fim”. Esse é o vale da sombra da morte.



O QUE É O VALE DA SOMBRA DA MORTE? VALE DA SOMBRA DA MORTE É UMA CIRCUNSTÂNCIA ONDE IMPERA A ESCURIDÃO


O vale é de sombra, não tem luz. No vale da sombra da morte nós perdemos o senso de direção. Você já esteve em situação em que não sabia o que fazer? Já esteve em situação em que foi dormir com uma idéia, dizendo: “Amanhã de manhã, na primeira hora do dia, quando eu me levantar, sei exatamente o que vou fazer”. Você foi dormir convicto, inclusive ansioso para amanhecer o dia para que você pudesse tomar aquela providência.

Mas quando você se levantou na manhã seguinte, aquela convicção da noite anterior já não estava mais presente, e você se sentou de novo e disse: “Não sei se isso é realmente o mais certo, se esta é a melhor decisão...”.

Há circunstâncias em que vivemos nesse ciclo de vai-não-vai, para-lá-para-cá, ficamos desnorteados, perdidos, e não enxergamos as coisas à nossa volta. Certamente você já passou por situações em que disse não conseguia entender as coisas: “Eu não sei porque, eu não consigo entender, eu já orei, eu já dediquei a Deus, mas eu não sei porque estou aqui ainda, eu não sei o que é que Deus está pretendendo. Se Ele queria que eu entregasse algumas coisas, já entreguei. Se Ele queria que eu ajoelhasse, já ajoelhei. Se Ele queria que eu falasse, já falei. Se Ele queria que eu me reconciliasse, já me reconciliei. Eu não sei mais o que Ele quer. Já fiz o que eu podia, agora não sei mais, e a situação não mudou”.

Já aconteceu isso com você? Isso é vale de sombra da morte. Circunstância em que você perde o senso de direção, perde a capacidade de enxergar as coisas. É período de sombra e escuridão.


O QUE É O VALE DA SOMBRA DA MORTE? VALE DA SOMBRA DA MORTE É UMA CIRCUNSTÂNCIA NA QUAL ESTAMOS VULNERÁVEIS AO MAL

O salmista diz: “ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum”. Esse mal que ele não teme, é o mal religioso, o mal supersticioso, ou “mal espiritual”. Naquele mundo se temiam as pestes que voavam de noite e se propagavam na escuridão, pestes que não eram físicas, não eram apenas doenças, enfermidades, mas sim “espíritos do mal” (Salmo 91). O salmista sabia que os montes eram a habitação dos feiticeiros e dos deuses pagãos, por isso é que olha para os montes e pergunta: “De onde me virá o socorro?”, como que dizendo, “dos feiticeiros, dos pajés, dos esotéricos?” Não, absolutamente, “o meu socorro vem do Senhor” (Salmo 121). Aquele mundo era de fato, um mundo assolado por espíritos, e as maiores vulnerabilidades eram espirituais. E, uma coisa é preciso que se diga: lobos não têm escrúpulos. Quanto mais vulnerável sua presa, mais rapidamente ele ataca.

Os lobos se aproveitam da escuridão e da vulnerabilidade. O momento do desespero é um extraordinário momento de propostas diabólicas para a vida. O momento em que você já bateu nas portas e nenhuma delas abriu, o momento em que você já tentou todas a direções e nenhuma delas trouxe alívio ou solução, o momento em que você está desnorteado, sentindo-se vulnerável, amedrontado a respeito de como será o dia seguinte, convivendo com perigos que você não enxerga, com o coração cheio de ansiedade, essa é a hora ideal para o diabo sentar-se ao seu lado e fazer-lhe propostas, apresentar-lhe sugestões e dizer assim: “Amigão, você não precisa ficar nessa, eu tenho atalhos, eu tenho alternativas, quer ouvir? Eu tenho algumas soluções. Já que o seu Deus demora tanto, eu tenho algumas dicas”. O vale da sombra da morte é um momento de nossa vida quando estamos vulneráveis ao mal.


O QUE É O VALE DA SOMBRA DA MORTE? VALE DA SOMBRA DA MORTE É UMA CIRCUNSTÂNCIA ATEMORIZANTE

Eu não sei quantos de vocês têm medo do escuro, mas eu de vez em quando tenho. Nem sempre. Mas de vez em quando tenho. E eu me lembro quando eu o Nobu, lá pelos anos de 1985, 86, morávamos juntos num sobrado onde funcionava a “Casa da SETE” (Sociedade de Estudantes de Teologia Evangélica), ministério da SEPAL, onde trabalhávamos à época. Aquela casa tinha uma peculiaridade: nós morávamos no andar de cima e a luz só acendia lá no topo da escadaria que conduzia ao segundo andar.

Não sei porque não colocaram um interruptor em baixo, para a gente abrir a porta, acender a luz, e então subir a escadaria. Tínhamos que subir no escuro e acender a luz lá em cima. Eu me lembro das coisas que passavam pela minha cabeça enquanto eu subia aquela escada. No escuro, eu achava que quando acendesse a luz o Nobu estaria morto lá na sala, caído no chão todo ensangüentado. Eram imagens muito nítidas. Cenas que eu poderia descrever hoje como se fossem reais. Todas mentirosas. Frutos dos meus temores internos ou das flechas diabólicas. Maluquice, ou opressão. Quem sabe as duas coisas.

A escuridão amedronta, porque a escuridão nos coloca diante do desconhecido, do imponderável, e do imprevisível. Quando você conhece o perigo, ou o inimigo, quando você sabe qual é o mal que pode sobrevir contra você, isso atenua um pouco o temor. Mas na escuridão você não sabe de onde vem o ataque, qual será o perigo, quem é o inimigo. Essa é a hora do medo, do pânico. Esse é o vale da sombra da morte.


O QUE É O VALE DA SOMBRA DA MORTE? VALE DA SOMBRA DA MORTE É UMA CIRCUNSTÂNCIA INSUFICIENTE PARA NOS AFASTAR DE DEUS

O salmista não apenas diz “não temerei”, mas afirma o motivo: “Porque Tu estás comigo”. Não importa qual seja o perigo, não importa qual seja o conflito, não importa quão escura seja a circunstância, Deus está lá. Não importa nem mesmo o que foi que você fez para se meter nessa enrascada, Deus está lá.

Nada pode nos separar do amor de Deus: “nem a morte nem a vida, nem o perigo, nem a angústia, nem a tribulação, nem a fome, nem a perseguição, nem o presente, nem o futuro, nem os anjos, nem os demônios”. E não há lugar ou circunstância onde Deus não nos alcance, pois “nem altura, nem profundidade podem nos separar do amor de Deus” (Romanos 8.35,38-40).


O QUE É O VALE DA SOMBRA DA MORTE? VALE DA SOMBRA DA MORTE É UMA CIRCUNSTÂNCIA NA QUAL DEUS AGE EM NOSSA DEFESA


A presença de Deus no vale da sombra da morte pode ser silenciosa, mas com certeza Ele está agindo e vem em nosso socorro: “A tua vara e o teu cajado me consolam”. O cajado servia para duas coisas. Quando a ovelha estava caída num penhasco, num despenhadeiro, o pastor chegava o mais próximo possível da ovelha, e a certa distância, puxava a ovelha pelo gancho do cajado.

Mas também usava o cajado para conduzir ovelhas rebeldes e ariscas, que se desprendiam do rebanho com muita freqüência. Nesse caso, o gancho do cajado servia de alavanca para quebrar a perna da ovelha, de modo que ele perdesse os movimentos necessários para se desviar. A partir de então, seguia no meio do rebanho, meio mancando, mas já não escapava mais.

Por estas razões, podemos crer que o vale da sombra da morte é a circunstância onde recebemos o cuidado e a disciplina de Deus. No vale, Deus nos trata não apenas com o seu cajado, mas às vezes com sua vara, pois alguns vales de sombra da morte são resultantes de opções erradas que fazemos ou fizemos na vida, e principalmente pecados que nós cometemos. De quando em vez tudo fica tenebroso, mas a culpa disso é nossa, e esse é momento da vara. Em todo caso, ou necessitando de socorro, ou de disciplina, Deus age em nossa defesa.

Uma vez que compreendemos o que é o vale da sombra da morte, como podemos atravessar estes períodos de desesperança, desorientação, vulnerabilidade, medo, e tentações, de modo que a presença de Deus seja eficaz. O Salmo também oferece algumas sugestões para a travessia dos vale.


QUANDO ESTIVER DIANTE DO VALE, ENCARE O VALE DE FRENTE

Vales são inevitáveis. Quando você tiver de passar pelo vale, não procure atalho, não tente evitar o vale, não tente passar sobre o vale, não fique parado na entrada do vale. Atravesse o vale.

A sabedoria popular diz que “quando você tem um problema e fica parado olhando pra ele, ele vai crescendo como uma bola de neve, mas se você vai à direção dele não dá tempo dele crescer”. Quando você estiver diante do vale da sombra da morte, atravesse o vale. Se você ficar procurando atalhos, se você ficar tentando evitar o vale, o vale cresce. Toda vez que você protela a solução de um conflito, toda vez que você joga para a frente providências necessárias, toda vez que você adia o que deve ser feito e sabe que deve fazer, o enfrentamento vai ficando mais difícil.

Não busque atalhos, e não fique parado, porque ficar parado no meio do vale só resulta em uma coisa: mais tempo no meio do vale, mais tempo na escuridão, mais tempo na situação não desejada. Por isso, encare o vale de frente.


ENQUANTO ESTIVER ATRAVESSANDO O VALE, NÃO TENHA PRESSA DE CHEGAR DO OUTRO LADO


Preciso contar à experiência que tive com meu pastor. De vez em quando visitávamos livrarias juntos. Certa manhã de sábado, estávamos caminhando e, de repente, começou a chover forte. A livraria estava do outro lado da rua, a poucas dezenas de metros de distância. Ficamos protegidos sob a marquise do shopping, esperando a chuva passar, e a chuva não passava. Até que nos enchemos e resolvemos atravessar a rua mesmo com chuva. Sugeri: “Vamos dar uma corrida?” Mas ele respondeu: “Não, calma, vamos andando, porque quando nós chegarmos do outro lado, se atravessarmos correndo, a turma vai olhar para nós e dizer „esses dois caras tomaram chuva‟, mas se a gente atravessar andando, a turma vai olhar para nós e dizer „esses dois caras tomaram chuva‟, então é melhor a gente ir andando”.

Tentei argumentar, naquele profundo papo filosófico: “Pelo menos a gente toma menos chuva”. Mas ele disse: “Se a gente for andando, a gente toma chuva só de cima, se a gente passar correndo a gente toma de cima e de baixo, porque vamos pisar em poça e vai espirrar. Além do mais, se a gente passar andando, a gente olha onde pisa, presta atenção nos carros, na moto, na bicicleta, no guarda-chuva da madame, não espeta o olho. Então, vamos andando, porque na chuva, correndo, os riscos são maiores”.

Conversa de doidos. Coisa de gente desocupada em sábado de manhã. Diletantes a caminho de livrarias. Mas nunca mais me esqueci. Quando você tiver que atravessar a chuva, atravesse andando. Calma, não tenha pressa de chegar do outro lado da escuridão. Por que a pressa? Como se diz no popular, “a pressa é inimiga da perfeição”. O sujeito atabalhoado para resolver problema geralmente cria outro. Calma, pense, escute, ore, investigue, durma, descanse, coma, deixe passar a raiva, deixe estabilizar o medo, deixe esvaziar a ansiedade, coloque o coração na presença de Deus, calma, calma, calma. Pelo vale da sombra da morte, não corra, ande.


QUANDO ESTIVER ATRAVESSANDO O VALE, PEÇA SOCORRO AO BOM PASTOR

O salmista sabe que a presença de Deus é ativa. Sabe que o Bom Pastor tem nas mãos os instrumentos necessários para conduzi-lo até o outro lado do vale. Sabe que Ele conhece o vale, sabe que criou o vale, e está sobre o vale. Sabe que o Bom Pastor já passou pelo meio do vale. Não é isso que lemos em Hebreus? Que podemos buscar socorro no trono da graça, porque o nosso sacerdote já passou pelo meio do vale e pode nos socorrer na ocasião oportuna? (4.15,16)

Aprendi que a uma grande diferença entre Jesus e o Diabo, ainda que seja um atrevimento estabelecer termos de comparação entre os dois, é que o Diabo nunca foi gente. A diferença entre Cristo e o Diabo é que Cristo vestiu a nossa roupa, “tabernaculou” entre nós, viveu nas nossas aflições, teve sede, teve fome, teve sono, foi traído por gente, esfaqueado por amigos. Jesus foi humano, foi gente, encarnou, sabe da nossa dor, sabe o que passamos”. E quando nós olhamos para Ele e dizemos: “Senhor, o meu coração está cheio de uma coisa que eu acho que o Senhor nem imagina”, Ele diz: “Ah, eu sei o que é, eu passei por isso, eu conheço a sua situação”.

Perceba que no momento de atravessar o vale da sombra da morte, o salmista muda de pessoa no seu discurso. Antes ele vinha dizendo “Ele me guia, Ele me faz descansar, Ele me refrigera a alma”, mas quando chega no meio do vale da sombra da morte, já não é mais Ele, é “Tu estás comigo”. Até então o salmista estava falando a respeito de Deus, mas agora começa a falar com Deus. Nada como um vale de sombra da morte para nos colocar de joelhos e nos conduzir à oração. E, caso você se sinta constrangido de correr mais rápido e mais vezes para Deus na hora da aflição, lembre-se que “Jesus, estando em agonia e orava mais intensamente” (Lucas 22.44).


QUANDO ESTIVER ATRAVESSANDO O VALE, PEÇA VISÃO AO BOM PASTOR

Você já passou pela experiência de apagar a luz e ficar cego por alguns segundos? Primeiro, vem o impacto da escuridão, mas logo em seguida, seus olhos vão se acostumando e então você começa a enxergar algumas coisas, algumas sombras. O sujeito que sai muito apavorado na hora da escuridão, não dá nem o tempo para que os olhos se acostumem com as sombras. Vai tropeçando desnecessariamente, e se arrependendo logo em seguida. Fala precipitadamente, decide no calor das emoções alteradas, e logo depois, percebe que fez besteira.

Quando os olhos se acostumam com as sombras, as coisas ganham contornos mais nítidos e percebemos que algumas delas começam a fazer sentido. É extremamente importante pedirmos a Deus que nos ajude a enxergar as coisas com de fato são e do tamanho que são. Por que? Porque as sombras, em primeiro lugar, geralmente são maiores do que as coisas em si. Quando somos pegos de surpresa o problema parece do tamanho do mundo. Mas depois de algumas conversas, orações, conselhos e providências mínimas, percebemos que o monstro não é tão grande assim.


As sombras são também inofensivas. Ninguém luta com sombra. O sujeito luta com o Mike Tyson, não com a sombra do Mike Tyson. Se colocar o seu rosto na rota da sombra do soco do Mike Tyson, a sombra passa e não acontece nada. Sombra é inofensiva, mas nós achamos que a iminência do fim é o fim. Confundimos a sombra da morte com a morte. No vale da sombra da morte, a morte ainda não chegou, só chegou à sombra da morte. Quem está no vale da sombra da morte ainda não chegou ao fim. Peça para Deus lhe mostrar direito se você está lutando com a morte ou só com a sombra, pois quando lutamos com sombra, gastamos energia à toa.

Em terceiro lugar, sombras não resistem à luz. Quando Deus ilumina o nosso entendimento, e o mundo faz sentido, as coisas se explicam. Comigo funciona assim: se eu tenho um problema para resolver, fico angustiado, e aquela tranqüilidade vai para o espaço. Fico com aquele assunto na minha cabeça. Oro, converso, e aquilo me angustia, até eu achar a solução. Mas quando as coisas ficam claras em meu entendimento, já consigo dormir em paz mesmo que a solução ainda não tenha chegado, pois o vale desaparece.


QUANDO ESTIVER ATRAVESSANDO O VALE, SUBMETA-SE À DISCIPLINA DO BOM PASTOR

Disciplina, não é sinônimo de castigo, reprimenda e punição. Disciplina é orientação, aperfeiçoamento, direção, processo de lapidação. Por isso é que chamamos as matérias da escola de disciplinas. Disciplinas não são pesos, são oportunidades. Submeta-se a esse processo de Deus.

Aprendi cedo que Deus sempre troca o nosso conforto pela nossa maturidade. Se Deus chegasse para você agora, e dissesse: “Meu filho, você quer viver numa boa ou quer ser alcançar a verdadeira maturidade?”, o que você diria? Imagine que você está no vale da sombra da morte e Deus aparece dizendo: “Meu filho, você quer que eu leve você embora rapidinho do vale, ou quer aprender algumas coisas que, se não fosse o vale, você não aprenderia? Você quer aperfeiçoamento ou soluções? Você quer sair do vale uma pessoa transformada e mais parecida comigo e que me conhece muito mais do que me conhece hoje, ou quer que eu te leve agora lá para fora do vale?” O que você escolheria?

Há coisas, que nós só aprendemos no vale. Creio até que alguns nós estamos em alguns vales justamente porque Deus nos conduziu a eles. Nós estávamos andando tranqüilos, Deus veio ao nosso encontro, nos pegou pela mão e foi dizendo: “Vamos dar uma volta. Eu quero compartilhar algumas coisas com você”. Aí, você vai andando, e o negócio vai ficando mais escuro, você olha para Deus e fala: “Senhor, é aqui mesmo”?

Há momentos em que a última coisa que interessa para Deus é nos tirar do vale. E a grande questão é que nós, quando entramos no vale, pedimos: “Deus, me tira do vale, Deus, me tira do vale, Deus, me tira do vale, Deus, me tira do vale”, e esquecemos que até o vale coopera para o bem. E enquanto no vale você está obcecado pôr sair e encontrar a solução, você está tão focado no seu coração e em busca de solução que não tem ouvidos para aquilo que Deus está lhe dizendo. Resultado: mais tempo no vale. Deus levou você até lá para ter uma conversa séria, e enquanto você não ouvir, o vale não acaba.

No vale, que é escuridão, podemos ver muito pouca coisa. Mas podemos escutar tudo quanto Deus diz. Podemos escutar, inclusive, nossa própria voz, nossa consciência e nossos apelos mais profundos. Quanto mais rápido escutarmos estas vozes, melhor. Algumas lições na vida demoramos bastante para atender, mas devemos treinar os ouvidos e o coração para acatarmos rapidamente a disciplina de Deus. Quando estiver no vale, tire a roupa de sofredor e vista o jaleco de aprendiz.


CONCLUSÃO

Creio que esta expressão “Tu estás comigo” é o eixo ao redor do qual gira todo o Salmo 23. Creio também que o lugar por excelência da vida cristã. No vale, encontramos a justa medida de nossa maturidade. No vale, aprendemos a discernir a voz de Deus e o encontramos com mais profundidade. No vale, Deus nos ensina as lições mais preciosas de nossas vidas. No vale, descobrimos e experimentamos que nada mais é necessário do que “a presença de Deus”.

Observe que “nada me faltará, porque Tu estás comigo”; “eu não tenho medo dos meus inimigos que me olham com ódio, porque Tu estás comigo”, “eu sei que bondade e misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida, porque Tu estás comigo”, “eu sei que enquanto eu viver eu vou estar dentro da tua casa, porque Tu estás comigo, não é pôr causa da tua casa, é pôr causa da tua presença”.

Todo esse salmo gira ao redor do “Tu estás comigo”. Não há lugar melhor para discernirmos, descobrirmos, sermos tocados, encontrarmos a presença de Deus do que o dia do vale, do que a noite escura. Por isso é que a palavra de Deus diz “tenham grande alegria quando vocês passarem pôr provas e tribulações” (Tiago 1.2).


Quando você entra no vale, você pode saber que o vale é o lugar do encontro com Deus. Quando você entra no vale, o vale é o lugar do encontro com Deus. “Dizia eu no meu coração, „jamais serei abalado‟”. Que vida cor-de-rosa, que céu de papai-noel, que fragilidade diante do mundo, mas aí quando o salmista passa pelo meio do vale, ele sai do outro lado e diz como Jó: “Antes eu Te conhecia de ouvir falar, mas agora, agora os meus olhos te vêem” (42.5).